sábado, 1 de fevereiro de 2014

O que acontece quando evangélicos oram

Só permaneço cristão porque reconheço que Deus não se deixa manipular por rogos inconsequentes – bons ou perversos – de ninguém

Fonte: Guiame
 
 
oraçãoEvangélicos estrebucharam no exato momento em que a mídia alardeava a eleição do bon vivant, tocador de sax, Bill Clinton. Ravi Zacharias, um indiano evangélico radicado nos Estados Unidos, profetizou que a permissividade moral do novo presidente levaria a nação à bancarrota. Zacharias fracassou no prognóstico: Clinton obteve bons resultados na economia e ainda re-elegeu.
 
A neopentecostal Valnice Milhomens, precursora da teologia da prosperidade no Brasil, afirmou que Fernando Collor de Melo foi gerado em oração. O primeiro presidente impichado do Brasil teria nascido no colo dos evangélicos. Quando enfrentou Luis Inácio Lula da Silva, Deus teria levantado os crentes para que o caçador de marajás alagoano ganhasse a eleição.
 
Edir Macedo sugeriu que Lula não passava da encarnação de Satanás (anos depois eles se coligaram). Segundo o dono da Record, o diabo seria um anjo barbado, sem um dedo e de língua presa. A igreja que Macedo preside mobilizou multidões em vigília de oração para que Lula não chegasse aonde chegou.
 
Na invasão do Iraque, Max Lucado não hesitou em repercutir a enorme maioria evangélica. Durante um prayer breakfast, com George W. Bush presente, pastores de várias denominações abençoaram as tropas invasoras. Assim, com a unção dos evangélicos, uma maciça tempestade de aço avançou com tanques e aviões. Mísseis inteligentes devastaram a antiga Babilônia. Os danos colaterais foram enormes: milhares de mortos, crianças queimadas, homens desmembrados. Nenhum pastor fez mea culpa ou chorou. Pergunto: como algum desses homens consegue citar o Sermão do Monte? Bem-aventurados os pacificadores porque serão chamados filhos de Deus.
 
A rede de televisão estadunidense MSNBC noticiou que o psicólogo-pedagogo James Dobson, um ultraconservador da direita evangélica, convocou uma reunião de oração para pedir que Deus enviasse um temporal para prejudicar Barack Obama num discurso. A oração deu errado. O tiro saiu pela culatra. Um furacão quase acabou com a convenção dos republicanos.
 
Qual a correlação entre as narrativas? Simples. Ávidos de poder, homens e mulheres não hesitam em usar a religião como meio de sancionar ambições pessoais ou institucionais. Líderes religiosos perdem, inclusive, o medo de quebrar o terceiro mandamento: Não tomarás o nome de YHWH, teu Deus, em vão, pois YHWH não considera impune aquele que tomar seu nome em vão.
 
Eles seguem uma lógica: nós somos escolhidos, portanto, podemos acessar o poder de Deus para combater quem julgamos do mal. Se Bush se queixa de ser cristão e diz orar, ele não tem a mínima possibilidade de errar. Pastores não admitem que um homem de Deus seja capaz de capitanear uma política belicista. Mister President cumpre os propósitos eternos do Senhor. Se mortes acontecem, os crentes tiram uma teologia da manga: Deus precisa vez por outra sujar as mãos para cumprir a agenda.
 
Pronto! Discursos semelhantes justificaram a chacina de Montezuma. Alguns teólogos acreditam que a rapinagem espanhola na América Latina, que exterminou civilizações inteiras, foi necessária para acabar com a idolatria pagã. Quem tem coragem de ser coerente com a predestinação calvinista chega a dizer que Deus estava no controle dos navios negreiros. Para sedimentar a civilização cristã, negros agonizaram no porão de navios imundos porque Deus quis ou deixou acontecer com algum propósito. Homens e mulheres desapareceram anônimos. Feito bichos acorrentados urraram sem que ninguém os ouvisse – e Deus gerenciou todo o horror? Caravelas partiram da península Ibérica com direito a missa e as bênçãos do Papa – tudo para a glória de Deus.
 
Feitiçaria consiste no esforço de manipular a divindade para que algum objetivo humano se cumpra. Religiosos se valem de suas orações para cooptar Deus porque se consideram dotados de força suficiente para ditar as ações divinas.
 
Só permaneço cristão porque reconheço que Deus não se deixa manipular por rogos inconsequentes – bons ou perversos – de ninguém. James Dobson, Valnice Milhomens e outros pretensos protagonistas de uma espiritualidade de resultado não têm o poder que imaginam, embora estejam muito bem financeiramente.
 
Soli Deo Gloria
 
 
- Ricardo Gondim
 

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